O ex-secretário de Educação de São Paulo, Gabriel Chalita, participará, no próximo dia 25, de um fórum em São Paulo para discutir responsabilidade social e ética. O evento será realizado no Centro Universitário Salesiano de São Paulo (Unisal), e a proposta é abordar como esses conceitos se relacionam com as áreas de administração, direito e pedagogia.
Em entrevista exclusiva para o Responsabilidade Social.com, Chalita fala sobre o que entende por esses termos e faz um balanço sobre o setor de educação no país. Chalita também aponta os principais desafios para a próxima década e elege os pontos que o futuro presidente deve priorizar para que a educação avance no país.
“A educação é a maior arma para garantir o desenvolvimento futuro do Brasil. Precisamos continuar a investir no ensino de nossas crianças e jovens e criar políticas públicas permanentes para o setor, como uma lei de responsabilidade educacional para os gestores públicos, com metas e obrigações a serem seguidas”, destacou. Chalita é doutor em filosofia do direito e em comunicação e semiótica. É autor da lei estadual que protege as crianças do bullying e membro da Academia Brasileira de Educação e da Academia Paulista de Letras.
Entre os títulos e as condecorações recebidas por ele, destacam-se o Prêmio Personalidade do Ano 2005 – Educação, conferido pela revista IstoÉ Gente; o Troféu Raça Negra 2005; o Prêmio Educação – Visconde de Porto Seguro 2004 e o Prêmio Fernando de Azevedo – Educador do Ano 2004, outorgado pela Academia Brasileira de Educação.
1) Responsabilidade Social – O senhor participará no próximo dia 25 do III Fórum Interdisciplinar sobre Ética e Responsabilidade Social, realizado pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo (Unisal). Qual o seu entendimento sobre esses termos? O que o senhor entende por responsabilidade social?
Gabriel Chalita – Ética e responsabilidade social são termos que caminham lado a lado, já que não é possível assumir responsabilidades sociais sem ser ético. Quem definiu com mais precisão o sentido da palavra ética foi Aristóteles. Ele afirmava existir um valor supremo, que norteia a vida das sociedades: a felicidade.
A corrente foi enriquecida, mais tarde, por outros filósofos que consideravam que a felicidade era o fim, o objetivo, e que a virtude era o meio, a ferramenta, para se alcançar a felicidade. Por sua vez, a responsabilidade social, realizada com ética, nada mais é do que a busca pela dignidade humana, é cuidar da pessoa toda e de todas as pessoas, no sentido de uma atenção integral a todas as dimensões de todas as pessoas. Uma das Encíclicas de Bento XVI ressalta a necessidade desse cuidado integral. Conjugar o verbo cuidar é essencial para a construção da dignidade humana, da ética.
2) RS – O senhor é reconhecido nacionalmente pelo seu envolvimento com o setor de educação, sendo um dos mais jovens secretários da área de toda a história do Estado de São Paulo. Na sua opinião, esse tema avançou nos últimos anos?
GC – Foi fundamental, em minha gestão na Secretaria de Educação (2002 a 2006), a participação de entidades e de organizações não governamentais em programas que implantamos. Dois deles foram os mais significativos: a Escola da Família e as Escolas de Tempo Integral. O programa Escola da Família chegou a ser premiado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Mantinha abertas, aos fins de semana, todas as escolas da rede estadual, com atividades educacionais e recreativas, sempre com a presença da família.
Também promovemos diversas ações de valorização dos educadores, como capacitações, bônus e cursos, que interferiam diretamente na melhoria da qualidade do ensino na sala de aula. Graças a esse envolvimento conseguimos diminuir o índice de violência e de evasão escolar em São Paulo. Foi um excelente momento da educação em São Paulo.
Além disso, oferecemos 50.000 bolsas para jovens que ingressavam gratuitamente em universidades, e que em contrapartida atuavam no programa, aos fins de semana, cada qual dentro da sua especialidade e com o seu talento. A escola ficou mais humanizada e próxima dos pais e alunos. Infelizmente, todos esses programas foram reduzidos a menos da metade, pelos gestores que vieram depois de mim, a pretexto de contenção de custos. É uma pena, porque educação não pode ser medida exclusivamente pelos custos, mas pelos resultados. E resultados não aparecem da noite para o dia. A educação é um processo, que requer persistência e continuidade.
3) RS – Para o senhor, as organizações do terceiro setor têm uma atuação forte nessa área?
GC – O futuro da educação está, também, na relação com empresas privadas e o terceiro setor. Há centenas de ONGs que acreditam na força da parceria. O Estado não conseguirá resolver nada sozinho e as entidades, sem o aporte estatal, também não. Por isso, o diálogo e parceria entre Estado e instituições não governamentais é fundamental.
Os principais desafios a serem enfrentados pelos gestores educacionais e pelas parcerias educacionais têm como foco a mudança nas relações de ensino/aprendizagem sob a perspectiva de formação de uma cidadania ativa em nosso país. Sob esse aspecto, é preciso entender, por exemplo, a importância dos projetos educacionais desencadeados pelo programa Escola da Família, e de se trabalhar sobre a metodologia de projetos, gerando uma rede de ações educacionais significativas para os alunos, fazendo com que a escola desenvolva um projeto de aprendizagem do mundo.
4) RS – Na sua opinião, quais os principais desafios da área na próxima década?
GC – A situação do ensino no Brasil vem melhorando progressivamente. Hoje temos uma diminuição nas taxas de repetência e abandono e, por outro lado, um aumento no número de matrículas. Acreditamos que os desafios da educação passam pela valorização do professor – a importância de fortalecimento do educador, tanto do ponto de vista profissional quanto de sua formação pedagógica. O Estado deve investir maciçamente na sua formação, pois é o principal elo condutor do ensino de qualidade.
A escola pública deve investir na adoção de temas transversais paralelamente às matérias cognitivas. Algumas ações devem ser implementadas, como o conceito de “escola da família” (a abertura das escolas nos finais de semana para integração de toda a comunidade), construção de uma escola cidadã, com o princípio do que cada pessoa, cada cidadão pode fazer por uma escola pública de qualidade e implantacão da escola de tempo integral, em que crianças e jovens permanecem mais tempo na escola.
5) RS – O senhor poderia apontar uma ação prioritária para o próximo presidente do Brasil para que o país avance nesse setor?
GC – Investir mais e mais no professor que é a alma do processo educativo. Muito já foi feito, mas resta muito ainda a fazer. Educação não é milagre, é processo. Não é possível fazer as coisas ou mudá-las de um dia para o outro. É preciso realizar sim, mas não é possível fazer nada de maneira inconsequente. Quero contribuir no que for necessário para fazer da educação brasileira uma obra bem sucedida em todos os aspectos.
A educação é a maior arma para garantir o desenvolvimento futuro do Brasil. Precisamos continuar a investir no ensino de nossas crianças e jovens e criar políticas públicas permanentes para o setor, como uma lei de responsabilidade educacional para os gestores públicos, com metas e obrigações a serem seguidas.
6) RS – O senhor é autor da lei antibullying em vigor na rede escolar municipal da capital paulista desde junho de 2009 e tem palestrado sobre a temática. Na sua avaliação, como os jovens brasileiros enfrentam esse problema hoje?
GC – Há dois anos, escrevi Pedagogia da Amizade, livro dedicado só a esse tema. É um convite à reflexão. Não há manual ou fórmulas definitivas para resolver o problema. No livro, conto histórias e casos relatados em encontros de educadores, pais e filhos que unem esforços na busca de caminho para solucioná-lo. É um livro que procura esclarecer o fenômeno do bullying e sua formas agressivas a professores, pais, alunos e sociedade, alertando-os para os males provocados por meio dessa atitude agressiva que costuma ser denotada como “brincadeira de mau gosto”.
A lei também ajuda no processo de combate à prática do bullying nas escolas. A boa notícia é que a ideia de uma lei antibullying como a de São Paulo está se espalhando pelo Brasil. Há casos em que a própria comunidade escolar – alunos e professores – tem elaborado projetos que levem a diminuição e combate ao problema.
7) RS – Os pais e os professores já estão preparados para perceber e agir contra esse tipo de violência?
GC – A lei prevê o envolvimento da família no processo de construção da cultura de paz nas unidades escolares e estabelece ações a serem desenvolvidas, como palestras, debates, distribuição de cartilhas de orientação aos pais, alunos e professores, entre outras iniciativas. Os pais têm papel fundamental nesse processo de conscientização e de engajamento. O papel do professor é o de promover o diálogo entre pais e filhos, orientá-los a dar bons exemplos.
8) RS – O que, na sua opinião, influencia a prática dessa violência e o que precisa ser feito para mudar o quadro no país?
GC – A origem está na família. Preconceitos nascem em casa. A criança é naturalmente preconceituosa. Mas vai se deixando influenciar pelo comportamento dos pais, pelo ambiente que envolve discussões sobre ideologia, condição econômica, etnia, orientação sexual. Vão povoando uma mente que ainda não tem condição de separar o joio do trigo. Só educação muda esse quadro. Educação é a arte do coração, dizia Dom Bosco. Se educarmos com amor, não existirá bullying, nem preconceito; não existirá discriminação, maldade. Quem ama cuida; quem ama prepara o outro para a vida.
Gabriel Chalita – Serviço: III Fórum Interdisciplinar sobre ética e responsabilidade social- Data: 25 de agosto de 2010, 19h30 às 22h00 – Local: Unisal Campus Santa Terezinha – Rua Augusto Tolle, 575, Santana, São Paulo – Inscrições: Até 24/08, pelo site www.unisal.br.
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