
Eliane Belfort
A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) é hoje a principal interlocutora com o setor privado e empresarial de São Paulo. Porta-voz do setor produtivo nacional, a Fiesp fala por 132 sindicatos patronais, os quais representam cerca de 150 mil indústrias de todos os portes e das mais diferentes cadeias produtivas. Tamanho gigantismo veio acompanhado de atenta observação sobre as tendências e debates sobre responsabilidade social empresarial (RSE). Em entrevista ao www.RESPONSABILIDADESOCIAL.COM, Eliane Belfort, Diretora Titular do Comitê de Responsabilidade Social (Cores) da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), fala com exclusividade sobre o histórico em RSE da Fiesp.
1) Responsabilidade Social – Como foi o processo de implantação do Comitê de Responsabilidade Social (Cores) na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e qual a sua missão?
Eliane Belfort – A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – Fiesp atua na área de Responsabilidade Social há 17 anos como grupo de trabalho. No início de sua gestão, o Presidente Paulo Skaf, em setembro de 2004, instituiu o Comitê de Responsabilidade Social – Cores com o objetivo de difundir o conceito de Responsabilidade Social Corporativa como ferramenta de gestão, contribuindo para a competitividade, o crescimento e o lucro das empresas. A atuação do Cores tem o respaldo do Conselho Superior de Responsabilidade Social – Consocial (também criado nesta gestão) da Fiesp e do Instituto Roberto Simonsen – IRS.
2) RS – Como a senhora define o conceito de Responsabilidade Social?
EB – É o exercício da ética e da cidadania com respeito a todas as formas de vida. Responsabilidade Social Corporativa é a atuação cidadã da empresa, que não pode ser confundida com ação social ou filantropia, ou seja, somente o aporte financeiro para o auxílio a um projeto social.
Estamos falando da empresa que incorpora os conceitos da Responsabilidade Social Corporativa em sua gestão, assim, oferece boas condições de trabalho e vida aos seus funcionários, familiares e, no entorno de sua fábrica, adota procedimentos de proteção ao Meio Ambiente (praticando reuso de água, utilizando energia renovável…), respeita o patrimônio material e imaterial da comunidade onde está inserida etc. Atualmente, o principal desafio para o crescimento econômico é conjugar inovação tecnológica com a inclusão social, transformando o conhecimento em riqueza. A atuação empresarial com Responsabilidade Social é ferramenta indispensável à retomada do desenvolvimento no Brasil, baseada numa economia forte, com eqüidade social e equilíbrio ambiental.
3) RS – O site da Fiesp disponibiliza uma ferramenta que permite a destinação de uma porcentagem do Imposto de Renda (IR) para projetos sociais que tenham como foco beneficiar crianças adolescentes. Como funciona este serviço e quanto já foi repassado para os projetos por ele?
EB – Uma das premissas deste programa é a Lei Federal 8069/90, que possibilita a Pessoas Físicas e Jurídicas doarem até 1% (Jurídicas) e até 6% (Físicas) do valor do Imposto de Renda devido para projetos sociais. A Fiesp divulgou e disponibilizou em seu site um software, desenvolvido pelo Grupo Gerdau, que permite calcular o valor que pode ser deduzido do Imposto de Renda para ser doado e, ainda, escolher as entidades sociais para destinar as suas doações, entre aquelas devidamente cadastradas pelos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCAs). Essa ferramenta permite a manutenção e ampliação da rede de proteção à criança e ao adolescente.
O objetivo do Cores com este programa é oferecer capacitação e autonomia, por meio da disseminação da legislação e do como fazer. Seria difícil mensurar os resultados dessa ação, em termos de valores repassados aos projetos, pois eles são cadastrados no nível municipal e a Fiesp atua em todos os municípios do Estado de São Paulo; portanto, teríamos que auferir os valores em todos os municípios, o que não é o foco do nosso trabalho.
Mas sabemos que o software, licenciado também pela Prefeitura do Município de São Paulo, após evento de divulgação realizado na Fiesp, em dezembro de 2005, fomentou as doações para o FUMCAD – Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de São Paulo. O FUMCAD passou de uma verba de R$ 1 milhão, em 2004, para a arrecadação de mais de R$ 70 milhões, em 2006.
4) RS – Quais são os projetos ativos da Fiesp na área de responsabilidade social?
EB – Uma das ações mais importantes do Cores foi a elaboração da Agenda de Responsabilidade Social da Fiesp. Trata-se do “Programa Sou Legal” que propõe a difusão, a discussão e a implementação dos conceitos de Responsabilidade Social Corporativa junto ao industrial paulista. Isso é feito por meio de Seminários, realizados por solicitação de Sindicatos, para seus associados, ou grupos de empresas – empresas e seus fornecedores, por exemplo.
Durante os Seminários são abordados conceitos como a Qualidade de Vida voltada para os colaboradores e seus familiares, abrangendo educação, saúde, esporte e lazer, como fatores do desenvolvimento humano, que levam ao comprometimento, à criatividade, à produtividade e à excelência. Para que os industriais possam desenhar suas políticas de Responsabilidade Social, são apresentadas as diferentes ferramentas disponibilizadas pelo sistema Sesi, Senai, Sebrae e pelos demais parceiros do Sou Legal. As ações do Programa envolvem ainda informações pró-transparência nas empresas, os aspectos legais dos financiamentos de campanhas eleitorais, os riscos e conseqüências do não cumprimento de obrigações tributárias, trabalhistas e ambientais, visando fortalecer o compromisso das empresas com a ética e o exercício da cidadania.
Em maio de 2006, a Fiesp assumiu, por meio do Cores, a Coordenadoria Executiva do Fórum Permanente de Empresas para a Inclusão Econômica das Pessoas com Deficiência. Atualmente integrado pelas empresas Editora Abril, CPFL Energia, HP Brasil, PriceWaterhouseCoopers, Shering do Brasil, Serasa, Telefônica, Visanet e Vivo, com a Coordenadoria Técnica do Instituto Paradigma. Este Fórum tem como objetivo promover a troca de experiências para a inclusão laboral de pessoas com deficiência, além de transmitir o know-how já adquirido por estas empresas a outras. O Fórum busca também proporcionar o diálogo entre empresários, a sociedade civil, o governo, a imprensa e formadores de opinião, promovendo a integração dos mesmos em torno deste tema. Em novembro do ano passado, foi lançado o “Guia dos Direitos das Pessoas com Deficiência”, resultado de um estudo elaborado pela Assessoria Jurídica da Fiesp e por membros da Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência da OAB/SP.
Por meio deste trabalho, o Cores está assessorado as empresas e os sindicatos para o cumprimento da Lei Federal 8.213, de 24 de julho de 1991, conhecida como Lei de Cotas e, em conjunto com a Assessoria Jurídica da Fiesp, busca apresentar propostas para o aprimoramento da Lei de Cotas, visando atender as dificuldades das indústrias no cumprimento desta Lei, apesar de todos os esforços empreendidos.
Em agosto deste ano, realizamos a Mostra Sistema Fiesp de Responsabilidade Sócio-Ambiental, com o objetivo de expor as políticas e as práticas de cidadania empresarial, apresentando como o capital privado tem sido investido a serviço do bem público. Composta por uma exposição e um congresso, a Mostra contou com quase 40 estandes e, no congresso, foram 37 sessões paralelas, que reuniram 142 palestrantes, entre acadêmicos, diplomatas, juristas e especialistas, nacionais e internacionais.
5) RS – Na sua opinião as indústrias brasileiras têm um desempenho satisfatório na área de Responsabilidade Social Empresarial? O que pode ser melhorado?
EB – As empresas brasileiras estão se desenvolvendo nessa área e algumas têm ações pioneiras, dignas de nota. Mas é preciso incutir, no empresário brasileiro, a noção de que a gestão com Responsabilidade Social e Ambiental é um fator de estímulo à competitividade. Existe uma falsa premissa, segundo a qual a empresa que investe em meio ambiente e responsabilidade social tem grandes despesas, e que isso tornaria essas ações um privilégio das grandes corporações. Quanto mais o empresário brasileiro compreender que a responsabilidade sócio-ambiental é boa para os negócios, e principalmente, que ela é fonte de novos negócios, um portal para novos mercados, mais ele estará apto a concorrer num mundo globalizado. Veja, por exemplo, o caso do Banco do Brasil, que criou o microcrédito para atender pessoas de baixa renda que pretendem investir em algo próprio. Sem qualquer viés “beneficente”, o banco encontrou um interessante nicho de negócios, que favorece milhões de pessoas e é bom para o País. Um projeto sustentável envolve também a integração das comunidades no entorno do empreendimento. Afinal, a empresa não é um ator isolad ela faz parte de um todo, e uma dinâmica positiva, que beneficie esse todo, será benéfica também para a empresa. É crucial, ainda, que o projeto da empresa seja auto-sustentável de fato. Isso significa que ele deve gerar lucro para seus sócios e investidores.
6) RS – Como a prática de responsabilidade social pode ser vista como um diferencial competitivo?
EB – O consumidor está cada vez mais consciente e exigente e, no comércio internacional, crescem cada vez mais as chamadas barreiras técnicas ou não-tarifárias. O que isso significa? Significa que o mundo exige das empresas um compromisso com a sustentabilidade. A empresa que polui, que explora mão-de-obra infantil, que impõe péssimas condições de trabalho aos seus empregados, estará condenada a fechar as portas, pois não terá mercado. Em contrapartida, aquela empresa que aposta numa gestão responsável terá mais facilidade para se estabelecer e competir. Não falo apenas da empresa cumprir a legislação, fazer tudo certinho, fugir do exemplo extremo de irresponsabilidade e má gestão que mencionei. Falo de fazer mais, de se destacar pelas suas ações corretas e inovadoras. Esse processo já está em curso. Cada vez mais, os países e as pessoas exigem certificados de origem e outras informações que comprovem que aquele produto ou empresa se alinha com essa nova mentalidade.
Outro exemplo é o Projeto Robalo, desenvolvido pelo Instituto Arruda Botelho, que teve início em 2003, com a comunidade de pescadores locais de Paraty (RJ). Este projeto alia capacitação e geração de renda, parcerias com o governo local e preservação de espécies e do meio ambiente.
7) RS – Ação social e responsabilidade social são a mesma coisa? O que diferencia um conceito do outro?
EB – A ação social pode estar relacionada a uma ação filantrópica. Por exempl uma empresa sustenta uma creche para mil crianças da comunidade. Ela está fazendo uma ação social, mesmo que os filhos de seus próprios funcionários não tenham acesso ao benefício. Mas a empresa que tem, em sua gestão, uma política de responsabilidade social, oferecendo, por exemplo, facilidades para que suas funcionárias amamentem os filhos ou os mantenham em creches próximas à empresa, está adotando uma política de responsabilidade social mais efetiva. Só que isso é pouco. Outro exemplo, agora no caso do meio ambiente. Uma empresa pode manter uma área de preservação para animais silvestres e, no seu cotidiano, desperdiçar água e energia, não adotar um sistema de reciclagem de resíduos, manter seus funcionários em péssimas condições de trabalho. Essa ação social, que é manter a área de preservação ambiental não significa, necessariamente, que a empresa adota uma política de gestão responsável social e ambientalmente. Já a empresa que se empenha em reduzir emissões de gases de efeito estufa, em reutilizar água, em usar energia racionalmente, em viabilizar a utilização de recursos naturais sem ameaçar a preservação da natureza, está dando um exemplo efetivo de responsabilidade sócio-ambiental.
8) RS – Na sua opinião, qual o ponto de equilíbrio em que a empresa gera ganhos para os seus sócios e investidores, e, ao mesmo tempo, assegura uma gestão responsável dos pontos de vista social e ambiental?
EB – A sua resposta já está inserida na pergunta, de certo modo. O especialista em sustentabilidade Andrew Savitz, um dos palestrantes da Mostra Sistema Fiesp de Responsabilidade Sócio-Ambiental, fala sobre o “ponto doce” ou o “sweet spot” (expressão emprestada de um esporte, o tênis), que cada empresa deve encontrar para assegurar ganhos para sócios e investidores e gestão social e ambientalmente responsável. Um conceito simplificado de sustentabilidade seria unir ao negócio o equilíbrio entre o lucro, a sociedade local e governos, com preservação de espécies e do meio ambiente, ou seja, o tripé da sustentabilidade reúne econômico, ambiental e social.
FIESP – E-mail: atendimento@fiesp.org.br (Endereço: Av. Paulista, 1313, São Paulo/SP – CEP: 01311-923) – Telefone: (11) 3549-4499
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