Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o Brasil lidera o ranking de maior proporção de jovens entre os desempregados em uma lista de dez países, que inclui Argentina, México, Alemanha, Espanha, Itália, França, Grã-Bretanha, Suécia e Estados Unidos. Estudo realizado pelo órgão apontou, ainda, que a taxa de desemprego entre os brasileiros com idades entre 15 a 24 anos é 3,5 vezes a dos adultos. Entre as ações promovidas pelo governo nas esferas federal, estadual e municipal e pelas organizações da sociedade civil para mudar esse quadro, destaque para o Programa Formare, da Fundação Iochpe – um projeto de educação profissional voltado para jovens de famílias com renda per capita inferior a meio salário mínimo.
Com cursos de operadores metalúrgicos e serviços, de assistente de produção e montagem mecânica, de auxiliar de produção e logística, a instituição já beneficiou aproximadamente 6,5 mil pessoas em todo país, sendo 1.500
somente no ano passado e colocou cerca de cinco mil jovens no mercado de trabalho. A iniciativa conta hoje com 48 empresas parceiras e mobiliza aproximadamente quatro mil educadores voluntários. Em entrevista exclusiva ao Responsabilidade Social, a coordenadora do programa, Beth Callia, conta como a iniciativa se tornou um modelo vitorioso de educação profissional dentro de empresas e revela os planos para este ano. Confira.
1) Responsabilidade Social – O Programa Formare, criado em 1988 como uma oportunidade de formação profissional a jovens de baixa renda, é hoje um modelo de sucesso, tornando-se a primeira franquia social do Brasil. A que a senhora atribui esse sucesso?
Beth Callia – O Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife) apurou que o investimento em projetos de responsabilidade social faz parte da estratégia de 91% das empresas no País. Ao mesmo tempo, é cada vez maior a demanda por mão-de-obra qualificada por parte dessas empresas. No Brasil, os estudos apontam que os jovens representam 48% do total de desocupados e o desemprego entre os jovens brasileiros de 16 a 24 anos é 3,5 vezes maior que entre os adultos. Mesmo com o atual crescimento da economia brasileira, o jovem continua enfrentando grande dificuldade de inserção no mercado de trabalho. Muitos se submetem a condições de subemprego ou ocupações com baixos salários e longas jornadas. Os programas governamentais para reverter esse quadro se deparam com a escassez de recursos e pouca articulação entre os vários setores e instâncias da esfera pública. Nesse cenário, programas de apoio à educação e preparação para o mundo do trabalho para jovens com investimentos operados por uma força de trabalho voluntário pode garantir às novas gerações uma melhor condição de vida e, dessa forma, contribuir para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. O sucesso do Formare está associado às demandas desse contexto sócio econômico e, claramente, por ser um projeto bem estruturado, com 20 anos de atividade e muitos resultados comprovadamente bem sucedidos.
2) RS – Como é pautado o programa, quais são as principais atividades desenvolvidas hoje e quais as metas para 2009?
BC – A Fundação Iochpe oferece apoio gerencial e pedagógico às empresas na implementação e desenvolvimento do projeto em cada uma das 76 unidades em operação. Já elaboramos 64 cursos diferentes para atender demandas específicas relativas aos negócios de cada empresa parceira. A proposta pedagógica baseia-se nas recomendações do Ministério da Educação (MEC) que prevê o desenvolvimento de competências e habilidades a partir da integração entre teoria e prática. Os jovens capacitados pelos cursos recebem certificados emitidos pela Universidade Tecnológica do Paraná (UTFPR). Mantemos programas de capacitação para os coordenadores do projeto e os educadores voluntários e fazemos acompanhamento e avaliações periódicas. A meta para 2009 é ampliar o número de jovens hoje atendidos pelo Formare e atingir um número maior de municípios brasileiros. Sonhamos em capacitar 2.000 jovens por ano.
3) RS – Na prática, como o projeto funciona? Qualquer empresa pode participar?
BC – O Projeto Formare se adequa bem em empresas de médio e grande porte que tenham acima de 300 funcionários no local onde serão ministradas as aulas. A empresa interessada deve oferecer o espaço para a sala de aula (com cerca de 60m²) e os seguintes benefícios para os alunos: bolsa auxílio, alimentação, transporte, seguro de vida em grupo, assistência médica, uniforme, material escolar, assistência social e psicológica. Além disso, a empresa passa a contribuir para o Fundo de Desenvolvimento da Metodologia Formare.
4) RS – Há uma participação ativa das empresas brasileiras nessa iniciativa? Quais os principais parceiros do programa hoje?
BC – Hoje temos 48 empresas parceiras do Projeto Formare que, juntas, totalizam 76 escolas. Graças a elas, neste ano foram capacitados 1.500 alunos. Cerca de 4 mil educadores voluntários, funcionários dessas empresas, participaram ativamente na formação desses jovens. As empresas parceiras do Formare são a Aché; Affinia; Alstom; Amsted Maxion; Arteb; Arvinmeritor; Bardella; Behr; Bosch; Conpacel; Consórcio Modular; Continental; Coteminas; Dana; Delphi; DHL; Eaton; Elektro; Equipav; Ericsson; Federal Mogul; Grupo Flanel; Grupo Ultra; Intermarine; Knorr-Bremse; Lear; Magneti Marelli; Mahle; Mangels; Maxion; Mextra; Milenia; Mueller; MWM International; Nívea; Plascar; Pelzer; Peugeot-Citroën; Santos Brasil; Satipel; Schaeffler Group; Siemens; Sogefi; Suzano; SYL; Videolar; Voith; ZF Sachs.
5) RS – Quais os principais retornos para as empresas parceiras?
BC – Compreendendo a empresa como um ambiente de aprendizagem, o Formare identifica sua potencialidade como agente educacional comunitário propiciando a formação de jovens de populações de baixa renda por meio da iniciação profissional. Por outro lado, vê a empresa como um ambiente de desenvolvimento de habilidades sociais, ao propiciar aos funcionários da empresa que adere ao projeto a oportunidade de atuarem como cidadãos, por meio da ação voluntária que, dessa forma, traz para o cotidiano da empresa durante o horário de trabalho, a possibilidade de uma contribuição efetiva na área social. De forma concreta, individual e coletiva. Dessa forma, a empresa exercita a sua responsabilidade social no seu próprio espaço ao mobilizar funcionários, outras empresas parceiras e organizações da sociedade civil em prol da educação de jovens de famílias de baixa renda. O resultado é que a empresa qualifica o jovem para o seu primeiro emprego e melhora significativamente seu clima organizacional.
6) RS – A crise financeira interferiu de alguma forma a realização do projeto nos últimos meses? Poderá afetar no próximo ano?
BC- Como em todos os segmentos, a área social também sofre alguns reflexos da crise financeira. No entanto, estamos otimistas e esperamos que a maior parte dos dirigentes de empresas compartilhe da opinião do presidente da MWM International, Waldey Sanchez. Ele diz o seguinte: “Uma organização com valores baseados na sustentabilidade não deve relegar as iniciativas sociais a um segundo plano justamente quando serão tão importantes para equilibrar a iniqüidade social que enfrentamos não só no Brasil, mas mundialmente. É nestes momentos que se enxerga o quão arraigados estão os projetos à cultura de uma organização.” Felizmente poucas empresas parceiras adiaram o início de novas turmas para 2009. Por outro lado, estamos sendo procurados por novas empresas interessadas em iniciar o projeto neste ano.
7) RS – Que balanço a senhora faz do que já foi feito nesses 20 anos de atuação? Quais os principais resultados que podem ser apresentados?
BC – Nestes 20 anos, mais de 6.500 jovens foram capacitados pelo Projeto Formare. Em média, 80% dos alunos entram no mercado de trabalho logo após a conclusão do curso. A cada ano cresce o número de pessoas interessadas em atuar como educadores voluntários. Fechamos 2008 com mais de 4.000 voluntários, e o que chama muita atenção são os depoimentos de educadores voluntários que voltam a estudar, e alguns até se tornam professores. Outros se destacam em posições de liderança na empresa. O material de apoio pedagógico evoluiu bastante desde então, o que nos orgulha muito. Além disso, nossas ferramentas virtuais de gestão nos permitem fazer um acompanhamento bem próximo das escolas, o que se faz necessário diante do número grande de empresas parceiras.
8) RS – As ações do programa evoluíram ao longo dessas duas décadas? De que forma?
BC – Desde a concepção do Formare, a Fundação Iochpe está atenta ao que pode ser melhorado na metodologia do Projeto e suporte às empresas parceiras. Além de nosso material pedagógico, desenvolvido especialmente para os conteúdos de educação profissional, ao longo dos anos intensificamos e multiplicamos as formas de apoio à gestão da Escola Formare: realizamos suporte pedagógico constante, visitas técnicas, encontros regionais e nacionais de coordenadores; os cursos de capacitação de educadores voluntários estão sempre se atualizando; e temos uma Comunidade Virtual que inclui acesso exclusivo do site, ferramentas virtuais de gestão e cursos de Educação a Distância. Para os alunos ampliamos as ferramentas de inserção no mercado, como a parceria com portais http://www.curriculum.com.br e www.buscajovem.com.br.
9) RS – Como a senhora define o conceito de “responsabilidade social”?
BC – O conceito de responsabilidade social é bastante abrangente: é uma maneira de gerir negócios de forma a transformar empresas em parceiras e co-responsáveis pelo desenvolvimento social do país. Isso envolve preocupação com todos os públicos: acionistas, funcionários, fornecedores, prestadores de serviço, comunidade, governo e meio ambiente. No caso do Formare, trata-se do comprometimento dos empresários na formação de jovens de comunidades de baixa renda e sem oportunidades de qualificação inicial para o mundo do trabalho. É a contribuição da empresa na melhoria da qualidade de vida destes jovens, que se preparam para iniciar suas vidas profissionais.
Programa Formare – Site: www.formare.org.br – Tel.: (11) 3103-8088
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