
Por Maria do Carmo
Responder essa indagação requer o resgate da trajetória que permeia os vários fatores mundiais, os quais, possivelmente, influenciaram o surgimento da Responsabilidade Social nas empresas. Podemos destacar, por exemplo, os movimentos em torno dos direitos civis ocorridos na Europa e na França na década de 60; as manifestações contra os efeitos das armas químicas na Guerra do Vietnã, que culminaram com o fortalecimento da organização da sociedade civil (igreja, fundações); e os efeitos de armamentos afetando, consideravelmente, o meio ambiente e a população, colocando em risco a sobrevivência da natureza e dos seres humanos.
Esses elementos provocaram um repensar na postura ética das empresas frente à sociedade. Os EUA foram pioneiros nas práticas de Responsabilidade Social, considerando-se que as empresas norte-americanas foram as primeiras a prestarem conta ao público de suas ações sociais, advindo, daí, a idéia de balanço social; entretanto, a França foi a primeira nação a tornar obrigatória a prestação de contas dos investimentos sociais das empresas com número de funcionários acima de 300. Dessa forma, estava plantada a semente de entrada das empresas no universo de co-partícipe da Responsabilidade Social.
No Brasil, o reconhecimento da função social das empresas culminou com a criação da Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas (ADCE), na década de 70, aliado ao enfraquecimento do Estado do Bem-Estar Social. Contudo, a concepção do conceito de Responsabilidade Social somente ganhou espaço no final da década de 80, consolidando-se, nos últimos anos, de 1990 a 2003.
Dentre os fatores influenciadores, destacamos:
a) a reorganização do capital, que muda o cenário econômico, tendo como pilar a competitividade mundial, regional e local, exigindo um perfil para a indústria e os trabalhadores;
b) a campanha contra a fome, de Betinho;
c) o fortalecimento dos movimentos sociais;
d) as profundas transformações do mundo contemporâneo, provocando a incerteza e a instabilidade como fatores ameaçadores à sobrevivência das organizações empresariais, ao mesmo tempo em que fortalecem a valorização do conhecimento e do progresso;
e) a insuficiência do papel do Estado, implicando nas graves críticas às políticas públicas, marcadas pelo assistencialismo, a insuficiência dos recursos, a privatização dos serviços sociais;
f) o crescimento da violência urbana.
Nesse cenário, surgem entidades empresariais como GIFE, ETHOS, PNBE, IBASE, Gazeta Mercantil, entre outras, tendo como foco um novo pensar e agir no âmbito empresarial, dando uma conotação cidadã na arte dos negócios.
Nessa perspectiva, o investimento social privado ganha corpo no Brasil, cujo olhar se centraliza na alocação voluntária de recursos privados, para buscar retorno alternativo de inclusão social e influenciar nas políticas públicas, organizações, universidades. Nesse contexto, é notória a necessidade de sobrevivência das empresas frente ao mercado internacional e aos seus consumidores, atuando como protagonista desse cenário o Grupo de Institutos e Fundações Empresárias – GIFE.
A trajetória, pontuada nessa síntese de cenário, remete-nos à indagação: o que é Responsabilidade Social Empresarial? Quais seus vetores? Como o mundo empresarial vai colaborar para a construção de uma sociedade mais eticamente responsável?
Tentamos encontrar essas respostas, a partir da definição de Responsabilidade Social, concebida pelos representantes do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável quando, em 1988, afirmou: “Responsabilidade social corporativa é o comprometimento permanente dos empresários de adotar um comprometimento ético e contribuir para o desenvolvimento econômico, simultaneamente, à qualidade de vida de seus empregados e de seus familiares, da comunidade local e da sociedade como um todo”.
Essa concepção assume a Responsabilidade Social como expressão de uma postura ética, comprometida com o resgate da cidadania, assumindo uma posição de co-responsabilidade, na busca do bem-estar público em articulação com as políticas sociais (institutos, fundações, organizações, universidades, comunidades, etc).
Oded Grajew, empresário e ex-presidente do Instituto ETHOS, reafirma esse conceito no momento em que pondera ser a Responsabilidade Social Empresarial uma forma filosófica de gestão das empresas; um importante fator de mudanças nas empresas; considera que é por meio da mudança de comportamento empresarial que podemos promover mudanças sociais que levarão o país a uma prosperidade econômica. O conceito de Responsabilidade Social está em construção, requer mudanças culturais, exigindo que empresas e parceiros busquem um processo conjunto, sem prejuízo de uns e resultados de outros.
A partir dessa reflexão, podemos responder, com maior precisão, as indagações postas, pontuando alguns aspectos a serem visualizados na prática da Responsabilidade Social, que preserva o comprometimento com a cidadania e a ética, tais como:
a) reconhecimento da empresa em relação à importância de investimento social, na perspectiva de transformação social;
b) conhecimento da realidade social no seu entorno (regional, nacional e internacional);
c) explicitação dos princípios e valores que nortearão os caminhos das iniciativas sociais das empresas;
d) implementação de uma pedagogia social, que responda aos aspectos mais significativos de seus princípios e valores;
e) reconhecimento e valorização do sistema de governança corporativa;
f) definição dos indicadores de efetividade, tornando público o balanço social.
Todas essas sinalizações são provocadoras de análise, para responder o conceito que emerge na sociedade contemporânea, dando conta das profundas desigualdades sociais de um mundo em transformação.
Maria do Carmo é Assistente Social, mestre em Planejamento e Políticas Públicas pela Universidade Estadual do Ceará. Consultora da Contexto, Consultoria e Treinamento, coordena o Núcleo de Assessoria Técnica em Educação do SESI-CE e assessora o Projeto Formação Cidadã, ligado ao Grupo de Ação de Responsabilidade Social da Federação das Indústrias do Estado do Ceará. É autora do livro “Educação do Trabalhador como Princípio de Responsabilidade Social: Reflexões sobre a Atuação do SESI-CE”. – E-mail: silveira@sfiec.org.br
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