
Renato Dolabella detalha a Lei de Acesso a Informações
Está em vigor desde maio deste ano a Lei de Acesso a Informações (Lei 15.527/2011). O texto legal visa garantir a todos os cidadãos o acesso às informações relacionadas à gestão de verbas públicas. O instrumento também alcança organizações do terceiro setor, visto que, embora não façam parte da Administração Pública, muitas delas recebem recursos públicos para a execução das atividades.
O advogado especialista em terceiro setor, Renato Dolabella, destaca os principais avanços que o mecanismo traz para o país e explica como ficará a prestação de contas para entidades do terceiro setor com implementação do instrumento. Ele também aponta os principais desafios para essas organizações se adequarem a nova lei. Confira a seguir a entrevista que Dolabella concedeu ao Responsabilidade Social.com.
Responsabilidade Social – Na sua opinião, qual a principal importância da Lei de Acesso a Informações para a sociedade brasileira?
Renato Dolabella – A LAI é relevante não só por estabelecer um dever de transparência, mas também por se tratar de uma norma que pode estimular na população uma cultura de vigília dos gastos públicos. É um marco importante que deve ser efetivamente utilizado para acompanhar o uso dado a essas verbas.
RS – Que tipo de dado será público com a Lei de Acesso à Informação? E como é feito o processo de classificação do que é ou não é sigiloso?
RD – O alcance da LAI é razoavelmente amplo, de modo que a regra é a transparência de informações e documentos em geral, sendo o sigilo a exceção. A restrição de acesso aos dados ocorre, sobretudo, em relação às informações pessoais relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem, bem como às informações classificadas como sigilosas em função de questões de segurança da sociedade e do Estado.
Para estas, a LAI apresenta critérios que devem ser levados em conta para eventual restrição de acesso, como aquelas que possam por em risco a vida, a segurança ou a saúde da população, as passíveis de prejudicar planos ou operações estratégicas das Forças Armadas, causar risco a projetos de pesquisa científica, entre outras hipóteses. Em qualquer caso, a classificação da informação como sigilosa deve ser devidamente justificada com base nesses parâmetros legais.
RS – O senhor acredita que a lei é um bom mecanismo para a transparência pública? Por quê?
RD – Trata-se de um mecanismo importante, pois, além de obrigar a divulgação em si de informações e documentos, também chama a atenção da população, por se tratar de uma lei que está sendo objeto de ampla cobertura jornalística. Nesse sentido, a conscientização das pessoas, no sentido de que elas têm direito de acesso a tais dados, fortalece a questão da transparência, na medida em que cada cidadão pode exercer essa prerrogativa.
Além disso, é possível notar a atuação de vários entes públicos no sentido de implementação do acesso a informações, inclusive nos âmbitos estadual e municipal. Tudo isso é positivo para a transparência pública.
RS – Quem serão os maiores usuários da lei no Brasil?
RD – Ainda é cedo para dizer, mas já podemos notar que a imprensa tem noticiado várias informações tornadas disponíveis em função da LAI. Além disso, espera-se que os próprios cidadãos sejam usuários efetivos desses mecanismos.
RS – Qual a importância da lei para o efetivo combate à corrupção?
RD – A corrupção é um fenômeno complexo, que deve ser combatido por todas as formas possíveis. Nesse âmbito, é muito relevante o papel já exercido pelo Ministério Público, Tribunais de Contas e demais órgãos de controle. Mesmo antes da LAI, qualquer cidadão já podia oferecer denúncias ou mesmo ajuizar ações populares na defesa do erário.
Assim, especificamente no que diz respeito à questão da corrupção, me parece que uma contribuição relevante oriunda da Lei de Acesso a Informações seria justamente o interesse que esta pode despertar, na população em geral, quanto à necessidade de acompanhamento da conduta de gestores públicos e ocupantes de cargos políticos. A conscientização, nesse sentido, pode tornar os cidadãos mais exigentes quanto à postura daqueles que gerenciam recursos públicos, o que inclui o combate à corrupção.
RS – A lei também alcança as instituições do terceiro setor, que embora não façam parte da Administração Pública, recebem recursos públicos para a execução de suas atividades. Quais informações devem ser divulgadas por essas instituições?
RD – Na esfera federal, o Decreto 7.724/12 estabelece que as entidades privadas que recebam recursos públicos devem divulgar, por meio de sítio na internet e quadros de aviso na sede da ONG, o conteúdo do seu estatuto social, a relação nominal atualizada dos dirigentes da entidade e a cópia integral dos instrumentos celebrados com o Poder Público, como convênios, contratos e termos de parceria, bem como os respectivos relatórios de prestação de contas. Se a entidade tiver relação com o poder público estadual ou municipal, essas exigências podem variar, de acordo com a eventual existência de legislação específica no âmbito desses entes federativos.
RS – Até agora, na sua avaliação, como era o cenário de prestação de contas para entidades do terceiro setor e como será com a instituição desse instrumento?
RD – Dependendo do tipo de relação com o Poder Público que era mantida pela ONG, pouca coisa muda. Isso porque determinadas normas específicas, relativas a certos tipos de repasse de recurso público, já eram até mais rigorosas quanto ao acesso à informação do que a LAI. Como exemplo, podemos apontar a legislação estadual de OSCIP [organização da sociedade civil de interesse público] em Minas Gerais. As normas vigentes antes da legislação de acesso à informação já obrigavam a entidade a divulgar o teor do termo de parceria, bem como os relatórios sobre a execução das atividades realizadas com recursos públicos.
RS – Na sua opinião, as ONGs já estão preparadas para atender as regras estabelecidas na Lei 15.527/11? Quais os desafios que se apresentam nesse contexto?
RD – O terceiro setor enfrenta atualmente um desafio quanto à sua profissionalização e sustentabilidade. O cumprimento das disposições da LAI será mais fácil na medida em que a entidade já se encontre em uma situação organizada de gestão, especialmente porque a legislação estabelece para as ONGs meios razoavelmente simples de divulgação das informações, como internet e quadros de aviso.
Contudo, diversas entidades sequer possuem conhecimento e orientação adequada para alertá-las sobre a necessidade de cumprimento dessa legislação. Nesse sentido, o maior desafio parece ser a própria capacitação da ONG para que esta tenha ciência do que deve ser cumprido, bem como a existência de um assessoramento permanente para acompanhar eventuais modificações nas normas, como é o caso do próprio surgimento da LAI.
RS – Para o senhor, de que forma esse instrumento pode ser útil para uma melhor aplicação de recursos públicos recebidos por essas entidades? Quais os principais avanços para o terceiro setor com a adoção desse mecanismo?
RD – A transparência na execução dos recursos públicos pelas entidades privadas sem fins lucrativos é importante, mas isso já estava incorporado em diversas normas aplicáveis ao terceiro setor antes mesmo da LAI. Assim, do ponto de vista de avanços, não podemos nos esquecer que há várias ONGs cujo objetivo é justamente acompanhar o gasto das verbas públicas em geral. Para estas, a LAI pode ser um mecanismo relevante e que facilita o seu acesso a informações importantes para esse acompanhamento.
RS – Qual o seu entendimento do termo ‘responsabilidade social’?
RD – O conceito de “responsabilidade social” pode ser amplo e diverso. Pode tomar várias formas, desde o empresário que contribui com a atuação de uma entidade do terceiro setor até aquele cidadão que atua como voluntário. Assim, a melhor compreensão do termo parece envolver a noção de que todos (primeiro, segundo e terceiro setores) compartilhamos o mesmo espaço e, portanto, temos uma responsabilidade para que nossas ações sejam harmônicas, de modo a possibilitar, direta ou indiretamente, a execução de atividades capazes de trazer bem estar para toda a sociedade.
Renato Dolabella – Telefone: (31) 2126-8093
Também nessa Edição :
Entrevista: Dagmar Garroux
Artigo: Sabe quando sei que falta liderança sustentável numa empresa?
Notícia: Fontes alternativas de energia são subaproveitadas no Brasil, aponta estudo
Notícia: Plano multissetorial busca tornar indústria brasileira menos poluente
Notícia: Estudo mostra que saúde dos oceanos do planeta está em risco
Oferta de Trabalho: Procura-se (08/2012)
Leave a Reply