Teve início, no dia 15 de março, o curso Sustentabilidade Corporativa, oferecido pelo Instituto Ecológico Aqualung, no Rio de Janeiro. Ministrada pelo diretor de Projetos em Educação Ambiental da empresa social Energy Marcon, Marcus Saussey, a iniciativa aborda temas como gerenciamento ambiental, gestão de projetos socioambientais, étic, responsabilidade social, ecoempreendedorismo, entre outros.
A proposta é discutir o papel do indivíduo em um novo modelo de gestão de negócios. “As empresas precisam ser capazes de considerar o bem-estar social, econômico e ambiental, focando em estratégias de longo prazo”, destaca Saussey, mestre em linguística aplicada pela Universidade Federal Fluminense e especialista em gestão ambiental pela Universidade de São Paulo.
Saussey pontua que as características de uma empresa ética devem ir além do cumprimento de exigências legais, comprometendo-se com a qualidade de seu produto no atendimento às expectativas de toda a cadeia de stakeholders. “No cenário corporativo, a ética deve ser entendida como uma das ferramentas primordiais para construção e consolidação da sustentabilidade, uma vez que indivíduos e organização relacionam-se mutuamente promovendo mudanças na sociedade”, avalia o embaixador do Clima pelo Programa do British Council “Climate Generations”.
Em entrevista exclusiva para o Responsabilidade Social, ele fala sobre as mudanças que observou na relação entre sustentabilidade e empresas nos últimos anos. Também avalia a maturação da agenda socioambiental corporativa brasileira. Aponta ainda as grandes tendências do movimento em direção à chamada ‘nova economia verde’.
Saussey foi, nos anos de 2011 e 2012, jurado do Prêmio Melhores Práticas na Administração Pública promovido pelo Ministério do Meio Ambiente. Possui cursos de extensão e pós-graduação em educação ambiental e meio ambiente em instituições como a Fundação Getúlio Vargas, por exemplo. Leia a entrevista na íntegra.
1) Responsabilidade Social – Qual o seu entendimento por empresa responsável? Quais devem ser as características dessa instituição, considerando os aspectos social e ambiental?
Marcus Saussey – Por empresa responsável eu entendo como sendo a empresa capaz de gerir seus negócios de forma ética e transparente. A definição do conceito de ética remete à orientação e formação de caráter dos indivíduos. No cenário corporativo, a ética deve ser entendida como uma das ferramentas primordiais para construção e consolidação da sustentabilidade, uma vez que indivíduos e organização relacionam-se mutuamente promovendo mudanças na sociedade.
Nesse sentido, as características de uma empresa ética devem ir além do cumprimento de exigências legais comprometendo-se com a qualidade de seu produto no atendimento às expectativas dos consumidores, estabelecimento de bom relacionamento com os stakeholders, funcionários, governos, ONGS e comunidades onde desenvolvem suas atividades, direcionando maior atenção na identificação e solução de possíveis impactos negativos resultantes de execução de suas atividades.
2) RS – Quais foram as mudanças que observou na relação entre sustentabilidade e empresas nos últimos anos?
MS – Nas últimas décadas aconteceram inúmeras transformações no que se refere à temática da sustentabilidade no cenário corporativo. Sustentabilidade diz respeito à coletividade e bem-estar. Cada vez mais as organizações percebem não ser sustentável consumir os recursos disponíveis até a sua extinção. O conceito de sustentabilidade está sendo encarado nas últimas décadas como pauta importantíssima tanto para as empresas quanto para os investidores. Nos últimos tempos as empresas devem prestar contas não apenas aos acionistas e credores, mas também a políticos, mídia, funcionários, defensores de direitos humanos, saúde pública, grupos comunitários. Esses stakeholders podem estar espalhados em diversas partes do planeta e possuem a sua disposição tecnologia capaz de disponibilizar em poucos minutos informações capazes de comprometer a imagem da empresa.
Outro fator importante se deve ao fato da legislação ambiental estar mais restritiva. Consequentemente as empresas se veem obrigadas a reverem o seu padrão de produção de forma a se manterem no mercado. Esses fatores são muito positivos levando-se em consideração que acabam sendo instrumentos de inserção da sustentabilidade na estratégia de negócios das organizações.
3) RS – Quando uma empresa decide se tornar sustentável, o que ela deve fazer? Contratar um consultor ou traçar por conta própria uma estratégia?
MS – Primeiramente a empresa deve conhecer muito bem o seu ramo de negócios examinando-o e traçando sua própria estratégia geral, de forma a integrá-la à sustentabilidade. A partir daí, conduzir seus negócios de forma a gerar um fluxo de benefícios tanto para seus investidores quanto para a comunidade, pois para que a sustentabilidade se estabeleça de fato é imprescindível que haja uma boa gestão estratégica. Uma vez que a sustentabilidade esteja inserida ao DNA da empresa, a contratação de um consultor, no sentido de identificar e orientar a organização sobre formas de aprimorar o processo de produção, deverá contribuir muito no processo de melhoria continuada e de interdependência das partes em interação.
4) RS – Que visão o senhor tem hoje do cenário mundial do ponto de vista da sustentabilidade corporativa e como o Brasil se insere nesse contexto?
MS – Percebo uma interconexão de caráter global em proporções muito maiores que em qualquer outra época. Um dos avanços no cenário mundial são os mercados de crédito de carbono. Considero-os como sendo um grande avanço enquanto instrumento econômico na área de gestão ambiental.
Sinto que o Brasil na atualidade privilegia interesses de curto prazo de forma a comprometer o futuro por ganhos imediatos. Não sei se optar pela eliminação a qualquer custo de obstáculos que possam vir a frear o plano de aceleração do crescimento de forma a beneficiar o empresariado é uma boa estratégia no que se refere à sustentabilidade (construção de barragens em áreas de proteção ambiental, pouco investimento na área de ciência e tecnologia, deficiência no sistema de compensação ambiental).
5) RS – Que práticas desenvolvidas pelas empresas ainda precisam ser mudadas para de fato construir uma sociedade sustentável?
MS – As empresas precisam ser capazes de considerar o bem-estar social, econômico e ambiental focando em estratégias de longo prazo. No aspecto social é importante considerar que pessoas ainda vivem em extrema pobreza, injustiça, sem acesso a água potável, saúde pública e saneamento; no econômico, através de uma distribuição de riquezas menos desigual; quanto ao ambiental, respeito ao capital natural; e no cultural, o respeito a identidades de populações tradicionais promovendo e valorizando diversidades culturais.
6) RS – Em tempo de baixo crescimento econômico, quais são as possibilidades e os limites de pensar uma economia que leve em conta a sustentabilidade? É possível conciliar crescimento econômico e sustentabilidade? Qual é a sua proposta?
MS – Levando-se em consideração que os pilares da sustentabilidade contemplam os aspectos social, econômico e ambiental, penso que a sustentabilidade deve ser exatamente o instrumento capaz de fazer avançar o crescimento econômico em períodos críticos. Entretanto, o conceito de sustentabilidade não deve ser entendido como sendo uma espécie de fórmula mágica para solucionar os problemas oriundos da maximização dos benefícios com a minimização dos custos e tempo, empregados durante o processo de produção de bens.
O crescimento desordenado acrescido ao elevado padrão de consumo tem causado impactos nem sempre positivos, uma vez que a capacidade de suporte do planeta não é respeitada. O cenário econômico mundial busca formas de desenvolvimento que atendam às necessidades das populações, e, não esgotem o capital natural. Faz-se necessário, a coexistência harmônica entre economia, sociedade e meio ambiente, através de práticas que priorizem a preservação dos recursos naturais existentes.
7) RS – Quais as grandes tendências desse movimento em direção à chamada ‘nova economia verde’?
MS – O conceito de economia verde é de fato bastante recente. Creio que o próprio desenvolvimento sustentado, enquanto conjunto de atividades econômicas, tem como objetivo final a busca por melhorias nas etapas do processo de produção no intuito de reduzir os impactos ambientais negativos. Quando não for possível eliminá-los por completo, de forma a reduzir possíveis riscos ao ecossistema ou à saúde humana, objetivando o bem-estar humano menos desigualdade social de forma a preservar o capital natural. Essas são tendências que vão de encontro ao estabelecimento do desenvolvimento sustentável. A economia verde ou sustentável é uma forma de se pensar um novo modelo econômico angariado na sustentabilidade.
8) RS – Qual o seu entendimento do termo ‘responsabilidade social’?
MS – Levando-se em consideração que empresas não atuam de forma isolada, pois interagem com diversos atores de forma interdependente, é possível dizer que a responsabilidade social envolve a dimensão de responsabilidade da empresa para com toda a cadeia produtiva e comunidades onde desenvolvem suas atividades (clientes, funcionários, fornecedores, ambiente e sociedade) devendo ir além da preocupação instrumental com a causa social ou cumprimento de leis, estabelecendo vínculo com a gestão do relacionamento com os multistakeholders, desenvolvendo suas atividades de forma ética e transparente e responsável.
Instituto Ecológico Aqualung – Site: www.institutoaqualung.com.br
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