A superintendente do Cenpec, Anna Helena Altenfelder, bateu um papo exclusivo com o Responsabilidade Social.com sobre um assunto de extrema relevância para a democratização da educação no Brasil: a Base Nacional Comum Curricular, que proporciona que todos os alunos, seja da rede pública, seja da rede particular, tenham acesso aos mesmos conteúdos durante sua vida escolar.
Responsabilidade Social – O que é a BNCC (Base Nacional Comum Curricular)?
Anna Helena – A BNCC é um documento no qual constam as diretrizes e os objetivos de aprendizagem para todo o ensino básico. Portanto, estabelece os objetivos que a partir de marcos legais, estabelecem objetivos de aprendizagem pra cada ano e cada série de todo ensino base.
RS – Como você analisa os resultados do estudo “Consensos e Dissensos sobre a Base Nacional Comum Curricular”?
AH – Em linhas gerais, nós observamos que em primeiro lugar existem muitos consensos e dissensos. Nós entrevistamos 100 pessoas de diferentes setores importantes para o debate sobre o currículo: acadêmicos, gestores, professores, participantes de movimentos sociais e raciais, sindicatos, diferentes fatores que circulam em torno do debate acerca da base curricular. Observamos que existem posicionamentos contra uma base comum, que detalhe bastante profunda e planejadamente sobre o que ensinar no dia a dia da sala de aula. A grande questão, dentro desse contínuo, é que existem posições menos favoráveis e mais favoráveis. Entretanto, é possível identificar questões que atravessam todas elas: a questão da diversidade, da identidade cultural e da cultura local. A preocupação em preservá-las significa garantir que as redes e escolas tenham um espaço para debater as questões locais, suas identidades locais e regionais, e mesmo questões de interesse de decisão, pois temem que a BNCC não deixe espaço e autonomia das redes municipais e estaduais para que as escolas decidam o que é importante ensinar para os seus alunos.
RS – Quais são as principais metas e desafios para a democratização da educação no Brasil?
AH – São vários, especialmente levando em consideração que os desafios e metas estão bastante sintetizados no Plano Nacional de Educação. Existe um produto concreto, um documento, e nele estão registrados, organizados e impressos os maiores desafios da educação, já contatos como meta. Consequentemente, a grande meta e o grande desafio é justamente implementar o PNE, pelo menos as metas que possam ser cumpridas (pois o documento que aborda essa questão de forma abrangente). Não nos espelhamos nele para realizar a pesquisa pois a BNCC é uma das metas do PNE, enquanto que o objetivo da pesquisa foi averiguar o que a comunidade pensava a respeito disso.
A pesquisa foi feita antes do PNE entrar em vigência e antes do MEC tomar a iniciativa de mobilizar e implementar essa estratégia de construção da base. Ela é relevante pois as questões que surgem são importantes para se pensar nas estratégias de implementação, depois que ela for validada e aprovada – está em consulta pública até Dezembro para que sugestões possam ser consideradas e inseridas e depois vai ser encaminhada para aprovação pelo Conselho Nacional de Educação. Aí vem o desafio da implementação, que significa manter aberto um amplo diálogo entre municípios e prefeituras, avaliar como a base vai conversar com o que já existe, rever as práticas de sala de aula e pensar em como a BNCC pode fazer parte do processo de educação de futuros professores. Tudo isso é importante pois a ao mapearmos essas questões, dúvidas e oposições, podemos pensar melhor nas estratégias. Já a partir da pesquisa nós observamos que ficou para os Estados, municípios e escolas, as questões das identidades, culturas locais e diversidade, mas junto com a base o MEC deve fomentar apoio para desenvolver.
RS – Qual a principal diferença entre o acesso a conteúdo na rede pública e na rede particular?
AH – A grande diferença é o acesso ao conhecimento. Diferenças concretas, objetivas e reais de ensino e de aprendizagem. Além disso, as condições de trabalho dos professors, infraestrutura, locomoção majoritária pelo defeituoso transporte público e materiais disponíveis fazem diferença entre escola pública e privada. Não estamos falando aqui de todas as escolas, pois o fato de ser pública ou particular não as definem. Assim como existem públicas de muita qualidade, há escolas particulares em decadência. Lógico que ao analisarmos pela média, os alunos de escolas particulares tem melhor desempenho. O que as pesquisas apontam é que o nível socioeconômico da família e a origem do aluno ainda é um fato muito preponderante, o maior fator de desempenho. As avaliações externas que fazem com que a escola particular esteja acima da pública é porque mais do que a posição da escola, o nível socioeconômico exerce maior influência. Isso, por sua vez, traz à escola pública uma responsabilidade maior de se envolver efetivamente no ensino de qualidade e garantir que alunos possam aprender para que esse efeito seja melhorado.
RS – Quais direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos devem ser levados em consideração para a construção de uma BNCC?
AH – Ela tem que partir de um direito básico de que todos os alunos e alunas devem aprender e se desenvolver para poder fazer frente ao projeto de vida que desejarem. O que está explícito no documento são os direitos e temos que pensar nesse como o direito básico e primordial.
RS – De acordo com a pesquisa, quem é contra e quem é a favor de um currículo nacional?
AH – Não existe um setor especifico, mas há uma preponderância de pessoas que tem discussão com a Base situadas na academia e em algumas esferas do governos, os gestores. Tanto os mais contrários quanto os mais favoráveis estão nesses setores. É interessante poder pensar que não se trata de um setor homogêneo. Os favoráveis estão bem diluídos entre todos os participantes, embora existam pessoas da academia e do governo que sejam contrários. Difícil estabelecer uma diferenciação.
RS – Como você avalia a educação brasileira? Houve avanços significativos na última década? Quais foram os retrocessos?
AH – Não tivemos avanços significativos, apenas com a inclusão do número de crianças na escola, nos aproximando da maioria de 98%, embora não possamos esquecer que em números absolutos ainda temos muitas crianças fora da escola. Os acessos aos livros do ensino médio aumentaram, embora ainda tenha uma evasão muito preocupante antes da criança chegar lá. Avançamos também na questão da distorção das regras, fortalecimento dos municípios e no próprio Plano Nacional de Educação, que reflete uma discussão mais ampla e sólida do que a versão anterior. Nós temos avanços. Mas temos enormes desafios, mesmo em relação aos avanços. Como por exemplo esse do ensino médio e de todas as crianças na escola, mas acima de tudo o grande desafio está em quando as crianças chegam na escola. Precisamos garantir a aprendizagem e driblar essa dificuldade de manter os alunos ao longo da escolaridade. O enorme desafio é garantir que eles aprendam o que tem direito.
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