Por Fernando Paulino e Carolina Pompeu
As organizações não-governamentais se definem por uma negação: “não-governamental”. Se não é governamental, o que é? Mercado? Mas outra definição bastante comum para o grupo também é “entidades sem fins lucrativos”. Se não visam ao lucro, então não é mercado. Não são governo porque suas definições não são compulsórias e elas não representam toda uma Nação. Não são mercado porque o dinheiro investido em projetos sociais não visam ao lucro e porque elas dependem de financiamentos externos, além de trabalho voluntário muitas vezes. O fato é que, cada vez mais, associações como essas vêm prestando serviços à sociedade e lutando por causas ligadas ao meio ambiente, às discriminações por gênero, raça ou opção sexual, ao bem-estar das crianças, aos povos indígenas, aos direitos humanos, entre tantas outras.
Grupos ligados à defesa dos direitos não são uma novidade. Cicilia Peruzzo explica que, nos anos 80, os meios acadêmicos discutiam a própria queda dos movimentos sociais, após um período de grandes manifestações originadas pelo momento político brasileiro. Mas enquanto isso, os movimentos sociais estavam se transformando de microorganizações em organizações mais abrangentes, impulsionados pela necessidade de somar forças. Hoje em dia, o que espanta são os números. Segundo a Rits (Rede de Informação do Terceiro Setor), há hoje no Brasil cerca de 250 mil organizações como estas empregando em torno de 1,5 milhão de pessoas. A diferença é que, segundo Boaventura de Sousa Santos, esses novos grupos vão além da mera concessão de direitos abstratos e universais. Eles exigem transformações concretas imediatas e locais. De fato, a temática é hoje a bandeira das ONGs. A grande maioria delas não vê necessidade de se unir a uma causa partidária: resolver seu problema, ou sua causa, é a única razão para própria existência.
Entre essas organizações, promover adesão de pessoas não é somente forma, é também fim. É fim porque aderir pessoas à causa é dar força a uma idéia. Não que se deva impor uma visão sobre um problema à sociedade, mas que esse problema seja discutido até o ponto de virar um problema de todos, ou melhor, ser descoberto por todos. E suficientemente debatido até que se chegue a conclusões de como ele deve ser enfrentado.
Para tanto, é preciso mobilizar pessoas. Bernardo Toro diz que mobilizar é convocar vontades para atuar na busca de um propósito comum, sob uma interpretação e um sentido também compartilhados. Se mobilizar depende de compartilhamento de interpretações e sentidos, mobilizar é comunicar. Não em um sentido unilateral, de mera informação, mas com o objetivo de congregar pessoas. Maria da Glória Gohn argumenta que estamos observando o desenvolvimento de outra concepção na sociedade brasileira, a de cidadania, tratada agora não apenas como categoria individual mas também coletiva.
Portanto, é clara a importância dos comunicadores nos processos de mobilização social. Para converter um discurso seco em um imaginário, transformar o imaginário existente em discurso para gerar ações, difundir o que está sendo feito por uma causa ou para converter o individual em coletivo. Em todos os casos, a mesma circunstância: unir vontades pelo bem-estar comum.
“Um jornal serve como serviço público”. A frase de TT Catalão que esteve impressa como parte de um artigo na capa do jornal Correio Braziliense do dia 19 de setembro de 1999 não é consenso. Se um jornal é um serviço público, ele deve divulgar o que é de interesse dos cidadãos? A própria pergunta é desapropriada porque os interesses dos cidadãos não são unos. Existem cidadãos e cidadãs, crianças, adultos, idosos, cidadãos banqueiros, cidadãos pedreiros, cidadãos negros, brancos… E nenhuma dessas características desqualifica qualquer pessoa como cidadão. A própria determinação do que é serviço público consiste em um julgamento de valor que, necessariamente, passa por interesses pessoais e corporativos do jornalista redator, do editor e do dono de um jornal.
“O problema é que nem sempre o que sai na imprensa é o mais importante, do ponto de vista do interesse público. Muitas vezes, o interessante, mesmo que desimportante, merece mais espaço que o importante, taxado de desinteresse”, lamenta Roberto Seabra. Mas, se por um lado é ingenuidade crer que um indivíduo se submeta totalmente ao que determinam as instituições de comunicação, por outro não se pode deixar de considerar que elas são decisivas em muitos contextos sociais. Não se pode acreditar que tudo o que for divulgado será recebido da mesma forma por todas as pessoas. No entanto, essas instituições são capazes de criar necessidades, motivações, seja reforçando padrões, seja provocando transformações.
O fato é que, muitas vezes, as instituições de comunicação assumem funções de educadores e participam da formação de um determinado público. Na ausência ou na impossibilidade de contato direto com várias questões que fazem parte da vida em sociedade, muitas pessoas têm nas instituições a única maneira de se informarem e julgarem diversas circunstâncias.
Dessa maneira, qualquer que seja o trabalho de uma ONG, ela deve considerar a importância das instituições de comunicação para tornar o ser trabalho legitimado. A idéia não é difundir o nome de uma organização, mas dar amplitude a um problema e uma idéia – para que seja coletivizada e participe das preocupações de um grupo cada vez maior e mais diverso de pessoas e, assim, ganhe forma e visão diferentes, cada vez mais ricas e mobilizadoras.
Fernando Paulino é jornalista e mestre em Comunicação pela Universidade de Brasília – UnB (E-mail: fopaulino@terra.com.br). Ele pesquisa modelos de Conselhos de Comunicação Social e outras formas de assegurar a responsabilidade social da Mídia. Carolina Pompeu é jornalista e aluna de Fernando Paulino na UnB.
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