
Dr. Fábio Ravaglia
Estamos vivendo mais. No Brasil, os idosos são quase 15 milhões, o equivalente a 8,6% da população. A projeção do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é que nos próximos 20 anos a população com mais de 60 anos ultrapasse a marca dos 30 milhões. O fenômeno global pode ser comprovado por números sem precedentes – em 1950 a população mundial de idosos era de 204 milhões; em 1998 alcançou os 579 milhões de pessoas e em 2050 será de 1,9 milhão. O aumento da expectativa de vida da população sempre nos remete à pergunta: como garantir a qualidade de vida nessa fase? Trata-se de uma questão muito pertinente, sobretudo em datas como o Dia Internacional do Idoso, comemorado em 1º de outubro e parte do calendário oficial das Organizações das Nações Unidas (ONU).
A qualidade de vida, sobretudo na terceira idade, está muito ligada à saúde, mobilidade física e sociabilidade. Envelhecer com saúde, dignidade e amigos é a chave para garantir a tão sonhada qualidade de vida. Nesse contexto entra a prevenção, prima-irmã do acompanhamento médico adequado e alinhado a cada fase da vida. É nesse momento que defendo a aplicação do questionário SF-36. Explicando melhor, a qualidade de vida dos pacientes, em especial os da melhor idade, pode ser avaliada por instrumentos genéricos ou específicos. No caso dos genéricos, utilizados para analisar a qualidade de vida de portadores de diversas patologias, destaco o Short-Form Health Survey (SF-36) – questionário multidimensional composto por 36 perguntas, englobando oito dimensões, que já foi adaptado e traduzido à realidade brasileira. Esse instrumento avalia tanto os aspectos limitadores das doenças como os positivos, decorrentes do processo de melhora ou cura.
A mensuração da qualidade de vida – utilizando o parâmetro das questões do SF-36 – é importante porque envolve diretamente o paciente e a percepção que este tem sobre a saúde e a qualidade de vida. A aplicação do SF-36 transforma o indivíduo em parceiro do profissional da saúde na escolha do melhor tratamento a ser adotado. Originado de um questionário de avaliação de saúde formado por 149 artigos, o SF-36 foi testado em milhares de pacientes e integrou um estudo amplo de avaliação de saúde. Questões como “comparada há um ano, como você classificaria sua saúde em geral, agora?” ou “durante as últimas quatro semanas, quanto de seu tempo a sua saúde física ou problemas emocionais interferiram com as suas atividades sociais?”, auxiliam médico e paciente a pensar (e repensar) de forma integral a evolução da condição de saúde.
É importante não perder de vista que a saúde e a qualidade de vida do idoso estão estreitamente ligadas a uma série de fatores que passam, inclusive, por aspectos psicossociais e pelo papel que a sociedade muitas vezes impõe aos “velhos”. Uma pesquisa divulgada pela Universidade de Gotemburgo (Suécia), de autoria do professor Valgeir Thorvaldsson, revela que um marcador crítico do declínio na saúde dos idosos com mais de 70 anos é a súbita mudança na capacidade de falar. Os pesquisadores analisaram por 30 anos um grupo de 288 pessoas, de 70 anos até à morte, e constataram que problemas de saúde e fragilidade na idade avançada levam à inatividade e isolamento do idoso. Em consequência, a falta de estimulação psíquica – obtida naturalmente com a convivência e interação com outras pessoas – pode acelerar o declínio mental.
A forma como os idosos são tratados tem reflexo direto na saúde. Um levantamento do Ministério da Saúde do Brasil revelou que a violência e os acidentes constituem 3,5% dos óbitos de idosos. Anualmente, 93 mil idosos passam por internações no Sistema Único de Saúde (SUS) por causa de quedas (53%); violência e agressões (27%) e acidentes de trânsito (20%). Com dados como estes e diante do processo contínuo de envelhecimento da população é urgente que as sociedades modernas mudem de atitude e voltem o olhar para bons exemplos – do passado e do presente. A importância do idoso em algumas sociedades indígenas ilustra o quanto o homem branco tem a aprender com os saberes tradicionais. Entre os Baniwa, tribo do Alto do Rio Negro (Amazônia), os idosos têm a função de contar a história da criação do mundo durante os rituais; contam a viagem mítica do homem na Terra. Os velhos sábios têm poderes sobrenaturais: os xamãs mais poderosos são os que adquiriram poderes ao longo dos anos. A própria sobrevivência do grupo depende dos mais velhos, os guardiões das tradições.
Associar o idoso à alegria não é o forte do Ocidente, que enxerga o idoso como sinônimo de doença e morte; segregamos o idoso porque ele nos lembra a finitude, a perda da beleza. No Japão, ao contrário, a tradição manda que ao completar 60 anos, o homem compre um blazer vermelho, pois somente com seis décadas de vida há a liberdade de usar a cor dos deuses. No Ocidente – onde os vermelhos são para os mais jovens – à medida que envelhecemos as cores vão ficando mais pálidas, sóbrias, tristes. Mas, apesar das limitações impostas pela sociedade aos idosos há ventos de mudança. A revista Business Week elaborou recentemente a lista “Twenty-Five Over Seventy-Five” – que em livre tradução significa “Vinte e cinco com mais de setenta e cinto” – ranking com 25 executivos, idades entre 75 e 100 anos, que comandam grandes empresas ou exercem influência real sobre os negócios. Apesar de não ser uma regra no ambiente corporativo, no qual a idade limite é 65 anos, há empresas que enxergam vantagens na experiência de executivos da terceira idade; vantagens intangíveis como intuição, paciência e perspectivas.
Que os bons exemplos se multipliquem e criem uma nova cultura mundial de valorização do ser humano.
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