
Pesquisadora Enid Rocha
IPEA divulga os resultados da primeira etapa do Levantamento Nacional de Abrigos para Crianças e Adolescentes. Segundo o estudo, a pobreza é o fator que mais dificulta o retorno à família de crianças e adolescentes abrigados
Os resultados da primeira etapa do Levantamento Nacional de Abrigos para Crianças e Adolescentes, realizado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas (Ipea), mostram que a maior parte dos dirigentes de instituições que oferecem programas de abrigo no Brasil (35,45%) aponta as condições sócio-econômicas das famílias, especialmente a pobreza, como a principal dificuldade enfrentada para o retorno das crianças e adolescentes às suas famílias de origem. “Por trás de uma criança de abrigo há uma família que foi abandonada pelo poder público, que não oferece, por exemplo, creches ou escolas em período integral que permitam aos pais sair para trabalhar tranqüilos em relação à educação e aos cuidados dispensados aos seus filhos”, diz Enid Rocha, coordenadora do estudo e diretora de Políticas Sociais do Ipea.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) determina que a medida de abrigo deve ser temporária. Sendo assim, é preciso empenhar esforços para reintegrar crianças e adolescentes às suas famílias de origem ou, quando isso é impossível, encaminhá-los para uma família substituta. Somente dessa maneira, o direito à convivência familiar previsto no ECA será respeitado. Entretanto, os profissionais dos programas de abrigo enfrentam dificuldades para promover a reintegração familiar. Para Enid Rocha, a pobreza dificulta o retorno. “Os dirigentes que ouvimos reconhecem que é difícil interromper o círculo vicioso de desemprego, vício, violação de direitos e abandono. Isso indica que as políticas dirigidas a crianças e adolescentes não estão suficientemente articuladas com ações de atenção às suas famílias, o que poderia não apenas evitar a institucionalização, como também abreviá-la quando fosse excepcionalmente necessária”.
Os dados da primeira etapa do levantamento apontam ainda como dificuldades para o retorno das crianças e dos adolescentes às suas famílias a fragilidade, a ausência ou a perda do vínculo familiar (17,64%), a ausência de políticas públicas de apoio à reestruturação familiar (10,79%), o envolvimento com drogas (5,65%) e a violência doméstica (5,24%). Demonstrando a importância do núcleo familiar, a maioria dos entrevistados (60,03%) indica a família como a instituição mais importante na condução de seu trabalho no abrigo, acima da escola (6,4%), igreja (3,56%), Conselho Tutelar (2,13%), governos (1,28%) e voluntários (1,28%).
Sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, 44,33% dos dirigentes de abrigo se dizem muito informados a respeito do seu conteúdo, e a outra metade (48,77%) se considera mais ou menos informada sobre os preceitos do ECA. A grande maioria (89,82%) afirma conhecer o artigo 92 dessa lei, que trata dos princípios que uma entidade de abrigo deve seguir no atendimento à criança e ao adolescente sob sua guarda. No entanto, apenas 29,7% afirmaram ter promovido mudanças nas instituições que dirigem depois de conhecerem o Estatuto. Para Enid Rocha, ainda não é possível concluir se a maior parte desses dirigentes considera que seus programas já estão de acordo com o preconizado pelo ECA ou se ainda não puderam promover as mudanças necessárias.
Na distribuição de programas de abrigo financiados pela Rede de Serviços de Ação Continuada (SAC) do Ministério de Assistência Social verifica-se que há uma desigualdade entre as regiões. O Sudeste concentra, sozinho, quase a metade (49,3%) dos programas cadastrados para receberem recursos. No Sul e no Nordeste o percentual é de 19,2% em cada, seguidos do Centro-Oeste (7,9%) e do Norte (4,5%). Uma das razões que explicariam a concentração pode ser o fato de os estados do Sudeste terem instituições mais organizadas, o que facilitaria o acesso aos programas sociais.
Porém, o número médio de crianças e adolescentes atendidos em cada programa na região Sudeste (22,6) é menos da metade do encontrado no Norte (51,4) e no Nordeste (50,6), sendo que o indicado é o atendimento a grupos de 20 a 25 crianças e adolescentes em cada abrigo. “Cremos que esses resultados podem ajudar o Governo a promover uma adequação das políticas públicas, visando oferecer maior eqüidade no atendimento às diferentes regiões do país e ajudar as instituições a promoverem as mudanças que forem necessárias para atender o que está disposto no ECA”, disse Enid Rocha.
A pesquisa que está sendo realizada pelo Ipea é promovida pela Subsecretaria de Promoção dos Direitos da Criança do Adolescente e pelo Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA). Conta ainda com o apoio da Secretaria de Estado de Direitos Humanos do Ministério da Assistência Social, do Comitê de Reordenamento da Rede Nacional de Abrigos Para Infância e Adolescência, e do UNICEF (Fundo das Nações Unidas para Infância). Seus objetivos são conhecer as características, a estrutura de funcionamento e os serviços prestados pelos abrigos, visando melhorar o atendimento a crianças e adolescentes atendidos pela Rede SAC. Até agora, não havia dados precisos sobre quantos abrigos existem no país, o número de abrigados nem sobre a adequação das ações dessas instituições ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A pesquisa busca sanar essa lacuna.
Todas as 660 instituições e programas de abrigos em todo o País que recebem recursos da Rede de Serviços de Ação Continuada (SAC) do Ministério da Assistência Social para a manutenção do atendimento a crianças e adolescentes. Os resultados ajudarão o governo a definir que tipo de política pública deve ser adotado em relação à rede conveniada de abrigos e também oferecerá aos gestores de políticas e de programas sociais informações relevantes para o estabelecimento de normas e diretrizes que possibilitem o reordenamento dos serviços prestados por essas instituições no atendimento a crianças e adolescentes em situação de abandono. Os resultados finais serão divulgados em dezembro.
Site: www.ipea.gov.br
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