
Cláudio Sales
À frente do Instituto Acende Brasil, instituto oriundo da Câmara Brasileira de Investidores em Energia Elétrica (CBIEE), Cláudio Sales fala à www.RESPONSABILIDADESOCIAL.COM sobre energias renováveis e o desafio nacional para promover o “crescimento sustentável”. Presidido por Cláudio Sales, graduado em engenharia mecânica industrial pela PUC e ex-presidente da Mirant no Brasil (ex-South Energy, gigante americana de energia), o instituto tem a missão de promover a transparência, a sustentabilidade e o empreendedorismo privado no setor elétrico brasileiro.
1) Responsabilidade Social – O que é o Instituto Acende Brasil e qual a sua missão?
Cláudio Sales – O Instituto Acende Brasil é a iniciativa de 15 grupos privados do setor elétrico que busca promover a transparência e a sustentabilidade do setor. Procuramos, baseados em estudos, informar à sociedade sobre assuntos relacionados à produção, distribuição e agora também transmissão de energia elétrica.
2) O que motivou a criação do Código de Ética Socioambiental pelo Instituto Acende Brasil, quais as suas diretrizes e quais as empresas que já fazem parte dele?
CS – A questão do meio ambiente é condicionante da sustentabilidade do setor elétrico. Desde 2006 estamos nos preparando para tratar desse tema. Sentimos necessidade de assumir publicamente um conjunto de compromissos que nos desafiasse a ir além do que está previsto em lei. Aí surgiu o código, um posicionamento sobre como podemos conciliar crescimento, meio ambiente e as comunidades. Foram definidos cinco princípios e quinze compromissos, que vão desde a redução e o controle dos impactos sobre o meio ambiente até transparência e diálogo. Com o código pronto, conclamamos as empresas a aderirem. Hoje são oito empresas: AES, CPFL, Duke Energy, Energias do Brasil, Iberdrola, Rede Empresas de Energia, Suez Energy e Tractebel.
3) RS – Como o senhor define o conceito de Responsabilidade Social?
CS – Responsabilidade social é a forma ética e responsável como desenvolvemos nossas ações, pensando no próximo, nas comunidades, no cuidado com o meio ambiente. Divulgar informações, investir em educação e saúde, ser transparentes são atitudes que demonstram o compromisso das empresas com a sociedade.
4) RS – O senhor acha que o Brasil terá problemas com energia nos próximos anos?
CS – Nossos estudos, em parceria com a PSR Consultoria, mostram que a situação não é confortável. O Programa Energia Transparente, lançado em abril último pelo Instituto Acende Brasil, com o objetivo de monitorar, a cada três meses, o risco de racionamento de energia no país, em sua última edição, em julho, prevê um risco de se decretar racionamento de energia de 7% em 2009, 9% em 2010 e 22% em 2011, enquanto o aceitável seria um risco máximo de 5%. Essa análise foi feita considerando crescimento do PIB de 4,8%, nenhum atraso nas usinas previstas para entrar em operação até 2011 e pleno cumprimento dos compromissos da Petrobrás quanto às usinas a gás. O estudo demonstra que, mesmo assim, estariam faltando cerca de 1.800 MW em 2011. Estes números sinalizam a necessidade de ação imediata do governo para assegurar que não haja frustração quanto à oferta de energia futura. De nossa parte, realizaremos no próximo 30 de outubro o fórum “Energia: Desafios Ambientais” para debater caminhos para agilizar a construção de usinas no país, com organizações não-governamentais, Ministério Público, órgãos ambientais, empreendedores, governo e sociedade Civil.
5) RS – Seriam as energias renováveis a grande solução para o problema de falta de energia no Brasil?
CS – Não existe uma grande solução. O crescimento do país impõe a necessidade de se utilizar energia de diversas fontes, com os cuidados sociais e ambientais adequados. As fontes renováveis em nenhuma hipótese podem ser desprezadas, principalmente, a de biomassa (metanol, biogás, óleos), que tem preços competitivos. No Programa Energia Transparente consideramos a participação de 3.300 MW de potência provenientes de fontes renováveis – eólica, pequenas centrais hidrelétricas e biomassa -, dos quais 910 MW já estão em operação e mil megawatts estão em construção. Quanto aos 1.390 MW restantes, há dúvidas quanto à implantação, principalmente, das usinas eólicas que, de acordo com relatório da Agência Nacional de Energia Elétrica, apresentam os maiores atrasos.
6) RS – O que falta no Brasil para que as energias alternativas ganhem força?
CS – O país tem estimulado a pesquisa e o desenvolvimento das fontes alternativas. A redução dos custos de produção dos equipamentos é uma questão de tempo. A produção, em escala, do álcool combustível é um excelente exemplo. Basta lembrarmos o custo de um litro de álcool na década de 80. Para ser mais barato que a gasolina, o álcool era subsidiado, com o passar do tempo foram obtidos ganhos de produtividade na cana, desenvolvidos processos mais eficientes nas usinas, junto com a venda do excedente de energia gerada a partir do bagaço de cana, que era um subproduto indesejado. Assim, chegou-se a um preço competitivo. Outras fontes alternativas podem passar por processo semelhante. Segundo relatório do Departamento de Energia Norte-Americano, já é possível gerar energia eólica por USD 50 por MWh, em média, o que é um valor muito competitivo.
7) RS – A discussão sobre o uso de energias alternativas tem ganhado espaço no Brasil. Em novembro deste ano, por exemplo, ocorre em Florianópolis a Eco Power Conference, um fórum de discussão sobre energias renováveis. Como o senhor avalia a produção de pesquisa no Brasil nessa área?
CS – Tenho acompanhado pouco a produção de pesquisa nessa área, mas o que tem chegado ao meu conhecimento não são grandes iniciativas no sentido de aprofundar o conhecimento. Em um dos itens do Código de Ética Socioambiental, as empresas se comprometem a investir em fontes de energia complementares renováveis.
8) RS – Segundo um estudo da Unicamp e da WWF Brasil, o Brasil pode, desde já, reduzir em até 30% o consumo de energia elétrica aplicando as boas e inteligentes práticas de eficiência energética. Você concorda com essa projeção? Por quê?
CS – É importante estimular boas práticas de eficiência energética, mas mesmo a redução de consumo tem um limite. As famílias e as indústrias já fizeram um grande esforço para diminuir o consumo de energia em 2001, e grande parte delas não retornou aos patamares de consumo anterior a esse período, então a possibilidade de reduzir o consumo é menor. Além disso, todas as propostas no relatório da Unicamp e da WWF de redução de consumo ou de perdas e de melhorias dos sistemas elétricos demandam investimentos nem sempre baixos.
9) RS – De acordo com relatório Global Trends in Sustainable Energy Investments 2007 os investimentos em energia renováveis no Brasil saíram de pouco mais de zero em 2005 para US$ 2,1 bilhões em 2007. Como o senhor explica esse crescimento?
CS – Boa parte com o crescimento da geração de energia elétrica por biomassa, que passou a ter preços competitivos. Hoje são 233 usinas, com 2.830 MW de potência instalada. A somar-se, temos 15 usinas eólicas com 236 MW de potência instalada e grandes investimentos feitos em outros setores, como no programa do álcool e do biodiesel.
10) RS – A expansão de oferta de energia é considerada uma das principais alavancas para a aceleração do crescimento econômico. Na sua opinião é possível crescer de forma sustentável?
CS – Este é o grande desafio. Precisamos crescer e não podemos abrir mão de preservar o meio ambiente e respeitar a sociedade. Essa é a razão de termos lançado o Código de Ética Socioambiental, com princípios e compromissos que irão nos nortear na construção e operação dos empreendimentos. Não podemos abrir mão de nenhuma das três dimensões da sustentabilidade: a social, ambiental e econômica.
11) RS – Depois da divulgação do relatório do Painel Intergovernamental das Alterações Climáticas (IPCC em inglês), que concluiu que o aquecimento global e as mudanças climáticas chegaram num ponto sem retorno, setores da economia têm procurado alternativas para “frear” um pouco este ritmo. O que o setor elétrico privado no Brasil tem feito nesse sentido?
CS – Oitenta e cinco por cento de nossa matriz elétrica tem origem em hidrelétricas, energia renovável. E o setor elétrico privado tem dado a sua contribuição. Atualmente, as empresas privadas estão construindo usinas hidrelétricas que totalizam 2.590 MW e representam 65% do que está em construção no Brasil, sem considerarmos as pequenas centrais hidreléricas. As termoelétricas, construídas recentemente pelo setor elétrico privado, também, são a gás natural que, dentro dos combustíveis fósseis, é o que menos emite gases de efeito estufa. Outra iniciativa a salientar é a Usina Termoelétrica que queima resíduos de madeira do setor moveleiro em Santa Catarina. Preocupa-me, porém, o fato observado no último leilão de energia A-3, onde devido à falta de outras fontes de energia, foram vendidos 1.304 MW médios de 12 usinas termelétricas movidas a óleo combustível, num sinal evidente de que precisamos discutir o planejamento energético e o processo de construção de usinas no país.
Instituto Acende Brasil – E-mail: claudio.sales@acendebrasil.com.br
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