O site apresenta nesta edição, uma análise de como está a situação do Estatuto do Desarmamento, após este ter sido aprovado no final do ano passado. O PTB – conhecido como “Lobby das Armas” – entrou com ação no STF contra a validade do estatuto. Além disso, aproxima-se a data em que a população, num momento inédito, irá decidir em um referendo, no próximo ano, se desejam ou não a proibição total de armas.
Para entender toda a questão do Estatuto do Desarmamento e sua tramitação, vale a pena fazer uma breve retrospectiva. Em 2003, havia quase 70 projetos de lei sobre desarmamento tramitando no Senado Federal e na Câmara dos Deputados. Em junho deste mesmo ano, o Instituto Sou da Paz fez um ato pelo desarmamento (com sapatos de vítimas de armas de fogo) em frente ao Congresso Nacional, que forçou os legisladores a se manifestarem sobre o tema.
Em julho, cinco deputados e cinco senadores se juntaram para criar um consenso em cima de todos esses projetos. O relator foi o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh, e o documento recebeu o nome de Estatuto do Desarmamento. “Entre 1997 e 2003, mais de 60 projetos de lei foram apresentados no Congresso Nacional, mas não conseguiam avançar por duas principais razões: o “lobby das armas” e a propagação de idéias incorretas sobre as armas de fogo. Se as barreiras a vencer eram grandes, maiores eram a necessidade e o desejo de superá-las”, diz Denis Mizne, diretor executivo do Instituto Sou da Paz.
A votação do Estatuto do Desarmamento seguiu da seguinte maneira:
- Foi aprovado em julho no Senado Federal;
- Foi para a Câmara dos Deputados, onde seria votado em regime de urgência. Mas a votação acabou sendo adiada. Em setembro, o Estatuto foi para a Comissão de Segurança Pública, sendo relatora do projeto a deputada Laura Carneiro. Nos dias 16 e 17 de setembro, após a apresentação do parecer, houve votação e o Estatuto foi um pouco desfigurado;
- depois de muita pressão popular, o Estatuto foi votado e aprovado na Câmara dos Deputados no dia 23 de outubro de 2003;
- no dia 22 de dezembro, o Estatuto do Desarmamento foi sancionado pelo presidente Lula.
“Mais do que garantir um futuro menos violento para todos nós, a aprovação e a sanção do Estatuto do Desarmamento são uma prova do avanço da democracia em nosso país e do poder de mobilização e pressão da sociedade civil”, comenta Mizne. Muitas foram as ONGs que se organizaram e enfrentaram lobbies e resistências. Dentre elas, destaca-se a contribuição do Instituto Sou da Paz, do Viva Rio e do CONVIVE – organizações que há muitos anos levantam a bandeira do desarmamento e agem cotidianamente em suas cidades para reduzir a violência urbana.
Desde então, diversas ações vêm sendo promovidas pelo “Lobby das Armas”, no sentido de barrar o Estatuto. O PTB entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no STF (Supremo Tribunal Federal) contra o Estatuto. Na ação, o partido alega a inconstitucionalidade total da lei (por questões formais) e de alguns de seus artigos (por questões materiais). Para o PTB, o fato de a lei ter sido proposta pelo Congresso invadiu competência privativa do Presidente da República.
Uma das inconstitucionalidades apontadas pelo partido estaria nos artigos: 2º – que diz que compete ao Sinarm (Sistema Nacional de Armas) “cadastrar a identificação do cano da arma, as características das impressões de raiamento e de microestriamento de projétil disparado, conforme marcação e testes obrigatoriamente realizados pelo fabricante”; e no artigo 23 – que determina que todas as munições comercializadas no país sejam acondicionadas em embalagens com código de barras, para que seja possível identificar o fabricante e o adquirente. A alegação é de que essas medidas seriam tecnicamente inviáveis e, portanto, contrariam o chamado “princípio da razoabilidade” da Constituição Federal.
De acordo com a Adin, a federalização do registro e do porte de armas, outra das medidas do Estatuto, também estaria em desacordo com a Constituição por “subtrair dos Estados sua competência administrativa do poder de polícia, vedando-lhes autorizar porte de arma de fogo aos seus naturais e residentes, segundo os interesses e necessidades locais”. Para o PTB, a inafiançabilidade dos crimes de porte e disparo de arma de fogo fere o “princípio da proporcionalidade, ao eliminar a possibilidade de concessão de liberdade provisória sem fiança para acusados ou indiciados por crimes que não chegam a lesar objetivamente a vida, a saúde, a integridade física, a propriedade”.
Por fim, a ação do partido alega que a proibição de venda ao cidadão comum fere o direito do comerciante, e que o aumento da idade mínima para comprar uma arma, de 21 para 25 anos, é descabida, já que o novo Código Civil reduziu de 21 para 18 anos, a idade mínima para praticar todos os atos da vida civil. Para Denis Mizne, a ação do PTB é muito mais política do que jurídica. “É uma tentativa dos que foram derrotados no Congresso, onde a discussão é legítima, de impedir de vigorar uma lei tão importante para o país.” Para ele, os pontos contestados pela Adin são justamente os que permitem identificar a arma e seu dono. “Isso só interessa ao bandido, a quem comete crimes, que é quem não quer ser identificado, e à indústria, que não quer ter trabalho.”
Além das ações contra o estatuto, ainda há a questão do referendo que está por vir, em 2005. A consulta popular é uma medida inédita no Brasil. Todas as pesquisas de opinião mostram a maioria da população sendo favorável à proibição total das armas. O Datafolha indica que 75% são favoráveis a proibição, contra 20% contrários. Pesquisas do Vox Pópuli, da Rede Globo e do Instituto Sensus também confirmam números similares. “A única ressalva que fazemos ao referendo, é que o Congresso não deveria se eximir de adotar a proibição o quanto antes, pois a cada 13 minutos que esperamos, mais um brasileiro é assassinado”, resume Mizne.
Sites: www.desarme.org e www.soudapaz.org
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